A verdade é que me apeteceu. E depois de me apetecer, fiz. Sempre acompanhada da mesma questão, sempre com a mesma dúvida, sempre a perguntar-me porquê?, e logo uma coisa qualquer, por detrás da cortina transparente da janela, e porque não? Seria uma voz, ainda que não se ouvisse? Não. Era, muito provavelmente, só uma coisa qualquer que não sabia o que dizia. Ainda assim, segui-a. Se é para ficar, para alimentá-lo todos os dias na tentativa de crer que algo válido, se é para o encher com reflexões que valham a pena, ainda não decidi. A verdade é que me apeteceu e fiz. Não sei porquê, nem porque não, mas curiosamente esse facto não é inquietante e, arrisco confessar, confere-me até uma sórdida liberdade. Veremos...
Por dulce surgy

Duas artes

A literatura e a fotografia tocam pontos comuns.
Ambas são narrativas. Ambas tentam condensar
num espaço limitado aquela parte da realidade
que nos é importante.

Em inúmeros autores podemos observar
exemplos da junção dessas duas formas de expressão,
em que, nuns mais que outros, o texto acontece
lado a lado com a fotografia, um apoiando o outro.

O que gostei nesta imagem, mas eu sou suspeita,
é a necessidade da utilização das palavras
para a concepção da própria fotografia.
Na verdade, esta apoia-se na expressão escrita
para ser, para existir.



E é claro que eu fico feliz com isso...





Foto de : Carlos Muralhas

Tu

Apetece-me que subas as escadas naquele vagar de quem sabe que o mundo não se esgota.
Apetece-me a tua mão a tocar ao de leve na madeira da porta e logo eu a abri-la, o sorriso a convidar-te.
E os teus olhos cá dentro da pele, os órgãos que se iluminam, qualquer coisa que aquece.
Apetece-me sermos países vizinhos, profundamente soberanos; só as nossas fronteiras que se tocam, só uns rios em comum que nos atravessam.

?

O que é a inspiração?
Não falo de levar ar aos pulmões,
ou talvez seja isso mesmo...

Que melhor imagem do que esta; aquilo que possibilita a vida?

Dissertação botânica

São como folhas, as gentes.

Pendem-se em aglomerados mais ou menos
extensos, admitindo posições hierárquicas
calhadas em sorte pelo lado do tronco em que nascem.
Embora pareça, não migram, são quase estáticas, tirando,
talvez, alguma agitação provocada
pelos ventos vespertinos e por chuvas outonais.
A maior parte serve de alimento a animais famintos,
outras há, porém, que são abrigo, albergue de vida,
bálsamos multicolores.

São como folhas, as gentes.

Umas amarelecem e caiem, esquecidas,
sob o solo que as absorve. Contudo, algumas,
poucas, são perenes. Ficam,
ainda que no rigoroso inverno nevado.
Ficam, pintando de verde as longas
tardes cinzentas melancólicas.
Ficam, ficam.
Anos, longos anos, inventando, para nós,
um renovado conceito temporal.

Crer no que não vemos, não,
mas sim,
criar o que não vemos.

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